Debate da 2ª mesa da Plenafup apontou caminhos para a reformulação do sindicalismo diante dos novos modelos de trabalho
[Da imprensa do Sindipetro PR/SC]
Os debates desta sexta-feira (13) da IX Plenária da Federação Única dos Petroleiros (Plenafup), segundo dia de evento, começaram com a mesa “Transformações nas Relações de Trabalho e Representação Sindical”.
Participaram a economista Marilane Teixeira, pesquisadora de relações de trabalho e gênero da Unicamp e membro do Fórum Permanente em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização, e o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, ex-diretor do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos (Dieese). A mediação ficou por conta dos dirigentes sindicais petroleiros Dary Beck Filho (RS) e Sergio Borges Cordeiro (Norte Fluminense).
Antes das explanações, a mesa exibiu vídeos com depoimentos de várias lideranças de movimentos sociais sobre as parcerias de luta com os petroleiros e os desafios para superar esse momento de retrocessos sociais e econômicos que o país atravessa.
Os debates também foram precedidos por uma declaração de Gessica Barbosa, esposa de Paulo Galo, líder dos entregadores antifascistas e integrante do movimento Revolução Periférica, que reivindicou autoria do incêndio da estátua do bandeirante escravocrata Borba Gato, na zona sul da capital paulista. Ambos foram presos sob a acusação de praticar dano ao patrimônio público. Galo participaria da mesa de debate da Plenafup, mas se ausentou por recomendação jurídica. “Fui presa por dois dias, deixando minha filha em casa, mesmo sem ter participado. Meu esposo ficou preso por 13 dias. Tivemos a ajuda de cada um de vocês e isso nos mantém fortes. Esse vídeo é uma forma de agradecimento. Unidos somos mais fortes. Obrigada por cada palavra, por cada apoio”, afirmou Gessica.
Marilane iniciou sua fala enaltecendo a participação das mulheres nos movimentos. “Das quatro saudações de lideranças, três eram de mulheres. Isso mostra a mudança na feição dos movimentos sociais brasileiros. A cara feminina começa a ganhar destaque, mas ainda precisamos de mais espaço no movimento sindical, o que vamos conquistando aos poucos”, comemorou.
Para ela, a organização sindical, diante do processo de reconfiguração do mundo do trabalho, deve considerar as especificidades do Brasil. “O que chama atenção é que o país perdeu a oportunidade de se inserir de forma mais ativa nessas mudanças tecnológicas que ocorreram nos últimos anos e estamos absorvendo essas transformações no trabalho da forma mais precária possível. Os exemplos são as plataformas digitais”.
A economista destacou dois movimentos que agravaram a precarização. “O primeiro são os impactos da pandemia e o outro é a própria regulamentação do trabalho a partir da reforma trabalhista de 2017. Quando olhamos para o Brasil, temos ainda que levar em consideração o problema central do excedente da força de trabalho. Com a crise chegamos no final de 2020 com 104 milhões de ocupados no Brasil. Significa que estávamos com 76 milhões de pessoas, ou seja, 34% da população em idade ativa fora do mercado de trabalho”.
Marilane ainda aponta que os governos Temer e Bolsonaro provocaram retrocessos históricos em termos de proteção social e a inserção periférica do país nessas novas tecnologias impactam ainda mais as condições dos trabalhadores. “O avanço do teletrabalho e do home office agravaram a individualização e a perda da noção do trabalho coletivo. Pensar a organização sindical nesses modelos é o grande desafio”, avalia.
A economista considera que o sindicalismo organizado a partir de uma sociedade salarial começou a se desafazer a partir dos anos 90 no Brasil. “Essas formas tradicionais de organização sindical nunca organizaram o conjunto da classe trabalhadora no país. Os setores menos estruturados sempre estiveram na periferia do sistema. É o trabalho informal, por conta própria. O sindicalismo sempre foi referência para esses setores não organizados, com bandeiras que dialogam de forma universal, como a conquista de direitos e a redução da jornada. Isso porque o movimento sindical brasileiro sempre pensou em uma agenda política para a classe trabalhadora e representa um norte nas ações”.
Em relação ao futuro, Marilane afirma que não se trata do fim do sindicalismo, mas “de um processo de transição para novas formas de organização que vão conviver com as formas tradicionais. Associações, coletivos e redes sociais, institucionalizados ou não, começam a ganhar peso como forma de organização do trabalho. O debate não deve ser sobre absorver essas novas formas, mas de conviver a partir de uma perspectiva de coletividade. É na luta com os movimentos sociais que vamos construir uma nova identidade e renovar o papel do sindicato para o futuro”.
Transformações dos Sistemas Produtivos
O sociólogo Clemente Ganz Lúcio, ex-diretor técnico do Dieese, explicou que estamos vivendo um período de profundas transformações no sistema produtivo. As mudanças tecnológicas têm impactado nos postos de trabalho, na formação profissional, aumentado a rotatividade e o trabalho informal ou por conta própria.
Ele alertou que o sindicalismo precisa compreender essas transformações, além de inovar na organização e na luta sindical. “Não vamos fazer uma reestruturação sindical olhando para o retrovisor”, afirmou.
No ramo do petróleo, analisa o sociólogo, é preciso olhar para além dos trabalhadores da Petrobrás e entender que a terceirização já é uma realidade e é preciso organizar essa força do trabalho como um setor político. “Diferente do modelo empresarial que divide com a terceirização, o movimento sindical tem que agregar. Os trabalhadores terceirizados não devem ser excluídos, mas sim incluídos na perspectiva dos sindicatos. A terceirização já está posta, já está dada e nós temos que responder sindicalmente a ela”, disse.
O sociólogo defendeu que não se conseguirá fazer uma reestruturação do projeto sindical se o ponto de partida para essa reformulação forem os limites legais. “A única possibilidade de termos um projeto virtuoso é se nós imaginarmos esse projeto independente. Para ser mais claro, nós não incorporaremos os terceirizados mudando os estatutos dos sindicatos. A mudança de agora deve transcender limites impostos pela legalidade, até porque boa parte das transformações legais estão sendo feitas para nos colocar fora do jogo”.
Ganz Lúcio apontou que enquanto os empresários têm defendido a negociação individual, o novo processo organizativo dos sindicatos deve dialogar com os trabalhadores sobre a importância de negociar coletivamente. “A questão é que nós fomos colocados no time reserva, muitos estão sendo colocados na arquibancada e uma grande parte pra fora do estádio, sem poder entrar. E nós precisamos decidir o que vamos fazer. Nós vamos arrebentar a porta pra entrar no estádio? Nós vamos arrebentar o alambrado pra entrar no campo? O que nós vamos fazer? Nós estamos sendo colocados pra fora do jogo. Na hora que a gente quiser entrar no estádio ou no campo, o estádio mudou. Não está naquele mesmo lugar, o estádio é diferente, a grama é outra. O nosso time quando entra em campo não pode fazer gol com a mão, já o time de lá faz gol com a mão e o VAR valida. A regra está sendo formatada contra a gente, é nesse ambiente que temos que pensar a reorganização sindical”, explicou.